20/04/2016
Xadrez do impeachment - Ex-ministros do Supremo estão em planos de Temer para Ministério da Justiça

Xadrez do impeachment - Ex-ministros do Supremo estão em planos de Temer para Ministério da Justiça.

19 de abril de 2016, 7h32

Por Pedro Canário

Os planos do vice-presidente Michel Temer para as áreas ligadas à Justiça terão duas etapas. A primeira será posta em prática durante os 180 dias em que a presidente Dilma Rousseff fica afastada enquanto o Senado julga o mérito do pedido de impeachment. A outra será posta em prática caso o mandato da presidente seja cassado e Temer passe de presidente em exercício para presidente de fato.

Na primeira etapa, o vice-presidente pretende chamar para o Ministério da Justiça alguém mais ligado à área jurídica que à política, ao contrário do que fizeram os governos petistas e de Fernando Henrique Cardoso. São cogitados os nomes dos ministros aposentados do Supremo Tribunal Federal Ayres Britto e Carlos Velloso.
Ideia de Temer é trazer para o Ministério da Justiça nomes que passem tranquilidade ao Congresso e ao mercado.

Felipe Lampe

Ambos foram presidentes do STF, são conhecidos e não tiveram seus nomes envolvidos em escândalos midiáticos que tomaram o noticiário político nos últimos anos. Velloso inclusive é o autor o voto vencedor na discussão no STF que definiu o rito aplicado ao impeachment de Fernando Collor.

Segundo pessoas próximas do vice-presidente, a ideia é trazer para a Justiça nomes que passem tranquilidade ao Congresso e ao mercado, enquanto Temer se concentra nas pastas ligadas às áreas econômicas e sociais.

Ao mesmo tempo, Temer pretende dar munição para que, nos bastidores, o ministro aposentado do STF Nelson Jobim enfrente a operação “lava jato”. Ele não faz parte do mesmo grupo político que o vice-presidente — eles já disputaram a presidência do PMDB —, mas é tido como nome forte, capaz de segurar os ânimos dos delegados da Polícia Federal, cuja atuação tem sido considerada política demais.

Michel 2016
A Polícia Federal é fator de insegurança para a classe política. Num Congresso em que há 300 deputados investigados ou réus em ações penais no Supremo, só terá apoio no Legislativo o governo que conseguir sinalizar controle do aparato de investigação. Por isso, no segundo momento, já depois que Michel Temer assumir a Presidência, a ideia é ter um nome forte para a Justiça, o mais antigo dos ministérios, para segurar a PF.

Quem acompanha a movimentação de perto afirma que não foi discutido a sério quem será o titular da pasta, mas que o ministro Gilmar Mendes tem sido apontado como um perfil “ideal”, até por conta de seus anos à frente do Conselho Nacional de Justiça — quando deu pistas do que é capaz de fazer à frente de um órgão administrativo com certo poder. Mas o ministro estará em plena Presidência do Tribunal Superior Eleitoral e dificilmente deixará o STF para participar de um governo.

O nome de Nelson Jobim agrada os correligionários de Temer, mas como advogado de empresas na “lava jato” traria consigo o perigo da antipatia da opinião pública. Mas é, sem dúvida, alguém que teria força política para comandar a PF.

Cabeças
A operação “lava jato” é peça chave nessa conta. As investigações, conduzidas pela Justiça Federal em Curitiba e pela Procuradoria-Geral da República, já deu todos os sinais de que seus próximos passos serão na área política, não mais na empresarial. Portanto, a operação jamais será “abafada”, como querem os parlamentares, sem que alguns trunfos anunciados no nascedouro sejam entregues à opinião pública.

Nesse quadro, Michel Temer teria de se comprometer a não se movimentar para salvar nenhum dos principais peixes pescados pelos investigadores até agora: o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Lula seria o troféu político. A “prova”, para os investigadores, de que o PT é uma organização criminosa que tinha como chefe o presidente da República e presidente do partido. Hoje as acusações contra o ele estão paradas por decisão do Supremo, que ainda não decidiu se ele pode ou não assumir a chefia da Casa Civil e, portanto, se tem ou não prerrogativa de foro por função.

Já Eduardo Cunha é réu numa ação penal no Supremo e investigado em pelo menos mais um inquérito. Já foi citado, até agora, em dez delações premiadas ligadas à “lava jato”. Se ele for condenado, o discurso de combate à corrupção passa a fazer mais sentido do que agora, em que 300 deputados investigados ou réus em ações penais votaram para derrubar a presidente.

Temer e Cunha são amigos de longa data e participam ativamente da vida política um do outro há muitos anos. Mas na montagem do governo, só um poderá sobreviver. Se Cunha for “anistiado”, o impeachment corre o risco de perder a legitimidade.

Pedro Canário é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico, 19 de abril de 2016, 7h32
« VOLTAR