03/08/2016
Condenados pela Justiça não podem aderir à repatriação, diz PGFN


Condenados pela Justiça não podem aderir à repatriação, diz PGFN

03/08/2016

Por Maíra Magro | De Brasília

Em parecer enviado à Justiça Federal de Brasília, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirmou que pessoas condenadas por qualquer instância do Judiciário – por crimes como sonegação, evasão fiscal, corrupção e falsidade ideológica – estão impedidas de aderir ao programa da Receita Federal de legalização de ativos mantidos no exterior, mais conhecido como repatriação. O impedimento vale, portanto, mesmo se a decisão condenatória ainda não for final.

O parecer foi emitido em ação judicial apresentada pelos bispos da Igreja Renascer Estevam Hernandes Filho e Sonia Haddad de Moraes Hernandes, que tentam aderir ao programa de repatriação, apesar de terem sido condenados pela Justiça Federal de São Paulo por evasão fiscal. O entendimento da PGFN também dificulta a vida de executivos já condenados pela Operação Lava-Jato, que perderão a chance de legalizar recursos não declarados.

Estevam e Sonia Hernandes entraram com mandado de segurança na 15ª Vara da Justiça Federal em Brasília questionando a Instrução Normativa 1.627 da Receita Federal, editada em março. Segundo a norma, “não poderá optar pelo regime especial de regularização cambial e tributária quem tiver sido condenado em ação penal cujo objeto seja um dos crimes listados no parágrafo 1º do artigo 5º da Lei nº 13.254 [Lei de Repatriação], de 2016, ainda que não transitada em julgado”. Os trechos legais mencionados pela instrução se referem aos delitos anistiados pela Lei de Repatriação – oito tipos de crimes contra a ordem tributária e contra a administração pública em geral.

A defesa dos bispos argumenta que a instrução da Receita extrapola as previsões da Lei 13.254, que se limita a dizer que a repatriação “não se aplica aos sujeitos que tiverem sido condenados em ação penal”.

Ao contrário da instrução da Receita, a lei não explicita se a proibição inclui condenados em primeira e segunda instância ou apenas condenações finais. A defesa também argumenta que a instrução viola o princípio da presunção de inocência, pelo qual ninguém deve ser considerado culpado sem uma decisão condenatória final.

Antes de tomar uma decisão, o juiz da 15ª Vara da Justiça Federal de Brasília pediu que a PGFN se manifestasse. Em parecer datado de maio, mas ainda não tornado público, a procuradoria defendeu a previsão da Receita.

“Tratando-se de programa especial de recuperação de ativos e sendo a extinção da punibilidade parte do regime temporário e excepcional de regularização, faz-se inoportuno e inconveniente ao interesse público que os réus condenados, ainda que isso não se dê em decisao definitiva, possam participar do programa”, diz o parecer.

Para a PGFN, o contribuinte só pode ser beneficiado pela anistia se aderir ao programa, com pagamento integral do imposto e multa, antes de uma sentença penal condenatória. O parecer aponta que a situação dos bispos Estevam e Sônia Hernandes é outra: “Uma vez que possuem sentença penal condenatória pelo crime de evasão de divisas, estão impedidos por lei de aderir ao programa, não podendo sequer apresentar a declaração de regularização cambial e tributária (Decart)”.

A PGFN também diz que não há violação da presunção da inocência na norma da Receita, mas apenas a fixação de requisitos para a participação no programa. A procuradoria lembra que a redação original da Lei de Repatriação impedia o ingresso apenas de pessoas com condenações definitivas no Judiciário, mas esse trecho foi vetado pela presidente afastada Dilma Rousseff e o veto foi mantido pelo Congresso – indicando a intenção de abranger condenações em todas as instâncias.

A Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) apresentou sugestão ao governo do presidente interino Michel Temer para que só fiquem impedidas de aderir à repatriação pessoas condenadas por crimes relacionados aos ativos que queiram regularizar.

“Não faz sentido impedir a adesão ao programa por uma condenação que não tenha nenhuma relação com o dinheiro a ser repatriado”, defende o advogado Luiz Gustavo Bichara, que integra o grupo de trabalho da Fiesp que está propondo alterações na lei. “Se uma pessoa de 70 anos falsificou uma carteirinha de estudante para levar a namorada ao cinema quando tinha 18 anos, não poderá repatriar. O mesmo vale para alguém condenado por sonegação de ICMS. Não tem sentido. Deve haver um link entre o dinheiro que se pretende repatriar e a condenação”, sustenta o advogado.

Valor Econômico
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