06/09/2016
Justiça obriga setor público a pagar fornecedor que deve imposto ao fisco

Justiça obriga setor público a pagar fornecedor que deve imposto ao fisco

06/09/2016

Fabricante de tubulações precisou ir a juízo para receber por material já entregue para empresa de saneamento que pretendia efetuar pagamento só depois de apresentação de certidão negativa


Operários trabalham em obra de saneamento público, um dos segmentos envolvidos no processo judicial Operários trabalham em obra de saneamento público, um dos segmentos envolvidos no processo judicial

Foto: Clemilson Campos/Estadão Conteúdo

São Paulo – Fornecedores do setor público que ficaram inadimplentes com o fisco estão precisando recorrer à Justiça para receber o pagamento por mercadorias que já foram até entregues.

Foi isso o que ocorreu com uma fabricante paulista de tubos plásticos que atende a Empresa Baiana de Aguas e Saneamento (Embasa). Após a entrega de cerca de R$ 60 mil, a empresa pública apontou que só efetuaria o pagamento após a apresentação da certidão negativa de débitos tributários (CND).

Para poder receber, a fabricante submeteu o caso à Justiça do Estado da Bahia, que logo proferiu decisão favorável mas ainda provisória, em razão da urgência do caso. “Os documentos demonstram o inequívoco direito da parte autora à pretendida tutela”, disse a juíza de direito Indira Fábia dos Santos Meireles, da 1ª Vara Cível e Comercial de Salvador.

Ainda na decisão provisória, ela determinou que a empresa de saneamento deveria deixar de exigir a apresentação de certidões negativas tanto para a fatura que foi objeto da discussão como para futuras cobranças.

O advogado que representou a fabricante paulista, também sócio do LCSC Advogados, Luiz Gustavo Rodelli Simionato, destaca que é natural e corriqueiro que os órgãos públicos exijam que os participantes de um processos de licitação comprovem sua regularidade fiscal por meio de apresentação da CND.

“Mas uma coisa é exigir regularidade [como condição] para participar de licitação. Outra coisa é exigir regularidade de quem já venceu a licitação e inclusive prestou o serviço”, afirma o advogado.

No caso concreto, ele explica que a empresa tinha de fato a regularidade fiscal no momento em que venceu o processo de concorrência pública, que ocorreu em forma de pregão eletrônico. “Mas no decorrer do contrato, a empresa foi tragada pela crise e passava por um momento de inadimplência de tributos”, reforça ele.

Na visão de Simionato, cujo escritório é também dedicado para empresas em recuperação, trata-se de uma situação que pode estar prejudicando um grande número de empresas que venceram as licitações, mas perderam a regularidade.

Jurisprudência

Apesar de órgãos públicos de várias regiões do País insistirem em negar o pagamento aos fornecedores sem CND, o entendimento predominante no Judiciário é que essa prática não tem sustentação legal.

“Apesar da exigência de regularidade fiscal para a contratação com a Administração Pública, não é possível a retenção de pagamento de serviços já executados em razão do não cumprimento da referida exigência”, afirma o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Benedito Gonçalves.

Se o pagamento fosse negado, Gonçalves também aponta que isso resultaria em “enriquecimento ilícito da Administração” e “violação do princípio de legalidade”, já que a hipótese de retenção do pagamento não está entre as punições estipuladas pela legislação de licitações (8.666/1993).

Simionato explica que, conforme o artigo 87 da lei, o órgão público poderia aplicar advertência, multa, suspensão temporária ou até impedir a empresa de participar das licitações. “Mas nunca poderia aplicar como sanção a retenção do pagamento”, afirma. Em vez de aplicar qualquer das punições previstas em lei, contudo, a empresa de saneamento continua fazendo novos pedidos à fabricante sem CND.

Mesmo diante de jurisprudência favorável, o advogado conta que a fornecedora de tubos também enfrenta a mesma negativa de pagamento em contrato realizado com órgãos públicos do Estado do Espírito Santo. E no caso da Bahia, mesmo com a decisão favorável, a fabricante de tubos ainda não conseguiu receber os valores aos quais tem direito.

“Ingressamos com a ação em junho. A decisão [favorável] é de julho. Agora em setembro a fabricante vai completar três meses sem receber”, diz Simionato, que agora está pedindo à Justiça a aplicação de multa diária por descumprimento da decisão. “Infelizmente essa situação de irregularidade fiscal têm assolado a grande maioria das empresas em crise. É algo corriqueiro.”

Roberto Dumke

Fonte: Justiça obriga setor público a pagar fornecedor que deve imposto ao fisco – DCI
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